Medidas de estímulo x juros altos: entenda como o governo tenta dar um ‘gás’ extra no PIB
A estratégia é oposta aos esforços do Banco Central (BC) para conter uma inflação pressionada pelo câmbio desvalorizado e pela alta nos preços dos alimentos. Haddad e Lula CLÁUDIO REIS/ENQUADRAR/ESTADÃO CONTEÚDO Ampliação do programa Minha Casa...
30/05/2025 | Economia


A estratégia é oposta aos esforços do Banco Central (BC) para conter uma inflação pressionada pelo câmbio desvalorizado e pela alta nos preços dos alimentos. Haddad e Lula
CLÁUDIO REIS/ENQUADRAR/ESTADÃO CONTEÚDO
Ampliação do programa Minha Casa, Minha Vida, criação do Consignado do Trabalhador, liberação dos recursos retidos do FGTS para quem optou pelo saque-aniversário e antecipação de pagamentos do INSS para aposentados e pensionistas.
Essas são apenas algumas das medidas anunciadas pelo governo nos cinco primeiros meses do ano.
Segundo especialistas consultados pelo g1, elas podem acabar impulsionando os resultados do Produto Interno Bruto (PIB) nos primeiros trimestres do ano, adiando os efeitos dos juros elevados e “mascarando” a desaceleração econômica que deve vir à frente.
A estratégia é oposta aos esforços do Banco Central (BC) para conter uma inflação pressionada pelo câmbio desvalorizado e pela alta nos preços dos alimentos. De setembro a maio, foram seis aumentos consecutivos da taxa básica (Selic), que levaram os juros a 14,75% ao ano, maior patamar em 20 anos.
Parte das ferramentas utilizadas pelo BC para controlar a inflação é justamente o aumento de juros, que se reflete diretamente no consumo, diminuindo a procura por bens e serviços. O crédito se torna mais caro e restrito, e as compras a prazo, menos acessíveis.
Mas os efeitos têm sido limitados. Os dados do PIB, divulgados nesta sexta-feira (30) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), indicam que o consumo das famílias subiu 1% no primeiro trimestre deste ano e 2,6% em relação ao mesmo trimestre do ano passado.
O resultado representa uma aceleração em relação ao quarto trimestre de 2024, quando o consumo das famílias havia recuado de 1%, já com algum efeito do aumento dos juros. Mas os estímulos do governo voltaram a impulsionar o PIB.
“Vimos várias medidas anunciadas nos últimos meses que têm potencial de trazer um bom impulso para a economia neste ano”, diz a economista-chefe da B.Side Investimentos, Helena Veronese.
Entre as principais medidas que injetaram recursos na economia, estão:
A ampliação do Minha Casa, Minha Vida, que aumentou o número de brasileiros com acesso aos juros mais baixos oferecidos pelo programa;
A liberação dos valores retidos do FGTS para quem optou pelo saque-aniversário, com previsão de distribuir cerca de R$ 12 bilhões a 12 milhões de trabalhadores;
A antecipação do 13º do INSS para aposentados e pensionistas, que beneficiou cerca de 15 milhões de pessoas; e
A criação do Consignado do Trabalhador, vista como uma das propostas com maior potencial para aquecer o PIB até o próximo ano.
Um estudo feito por economistas do Itaú Unibanco, por exemplo, mostra que o novo Consignado CLT (como também ficou conhecido o Consignado do Trabalhador) pode adicionar até 0,6 ponto percentual ao PIB entre 2025 e 2026.
A nova modalidade de crédito permite que todos os trabalhadores com carteira assinada contratem empréstimos, utilizando até 10% do saldo do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) como garantia, além de 100% da multa rescisória em caso de demissão sem justa causa (equivalente a 40% do saldo).
Entenda os efeitos do ‘choque de juros’ no crédito e na vida do consumidor
PIB cresce 1,4% no primeiro trimestre de 2025
Segundo Julia Gottlieb, economista do Itaú Unibanco, essa mudança não apenas ampliou significativamente o número de pessoas com acesso ao crédito consignado privado, como também aumentou a concorrência no mercado.
“É razoável que isso gere uma queda de taxa de juros e um aumento do prazo médio desses empréstimos”, diz a economista, destacando que, com isso, a parcela mensal paga pelo trabalhador também tende a ficar menor no médio e longo prazo.
“Esse dinheiro que sobra no final do mês vai virar consumo, ou ir para um empréstimo novo, [...] o que pode ter um impacto de mais 0,6 ponto percentual [na economia] em um intervalo de um ano”, completa Gottlieb.
Para os próximos meses, a previsão é que os estímulos fiscais podem até se intensificar com o surgimento de novas iniciativas. Entre as medidas em discussão ou já aprovadas estão:
O vale-gás, cuja mudança já foi anunciada e deve envolver a distribuição de vouchers de R$ 110 para compra de botijões para as famílias inscritas no Bolsa Família;
A ampliação de isenção do Imposto de Renda para quem ganha R$ 5 mil;
A ampliação da tarifa social de energia elétrica, que dá gratuidade para famílias do CadÚnico e que tenham consumo mensal de até 80 kWh;
Um possível crédito facilitado para que entregadores de aplicativo possam comprar motos;
e até um eventual aumento no Bolsa Família (que inicialmente já foi negado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad).
“Muita coisa ainda não veio como anúncio oficial, mas essas especulações dão a entender que o governo ainda tem mais coisa na manga para anunciar. A percepção é que o governo não vai deixar o PIB desacelerar”, comenta Veronese.
Essa perspectiva já começa a se refletir nas estimativas do mercado financeiro. No último boletim Focus, por exemplo, os analistas passaram a prever uma desaceleração mais branda da economia neste ano.
Para 2025, as projeções de PIB passaram de 2,02% na semana passada para 2,14% nesta;
Para 2026, por enquanto, a projeção dos analistas para o PIB segue em 1,70%.